7 de setembro de 2004

Crónica dos dias ausentes

Nascimento de estrelas


Ainda hoje penso que, quando realmente me permiti olhar-te, te reconheci (o toque da pele em busca do isqueiro), não falo de um reconhecimento místico, mas de algo que em mim te decifrou intuitivamente, as coincidências que não sei se são fruto do acaso (nem me interessa) inquietaram-me. Sei apenas que é como se me esperasses ou se, no meu mais profundo inconsciente, eu te esperasse. Sei também que na profundidade do teu olhar eu me perdi e era como se sentisse que tudo quanto então se passava comigo era vão e fútil… apenas uma etapa necessária para caminhar ao teu encontro. Não pude partilhar contigo essa certeza (e tenho poucas), seria demasiado brusco e tu terias talvez fugido… mais tarde tive a certeza que o farias…
A dor percorria-te, nalguns momentos, mas a energia que emanavas envolvia-me numa beleza suave e penetrante, quis dizer-te que também em mim escuridão e luz às vezes se degladiam, mas que nas duas é possível encontrar a serenidade, mesmo que, por vezes, a imensidão de sentidos por revelar se torne demasiado pesada. Ainda é… nas palavras não ditas, na intenção do gesto, no medo do excesso… no medo da perda… no medo do medo…
A noite está calma, hoje, tu não estás, eu poderia pairar por aí na forma imaterial do desejo e reencontrar-te-ía, se fosse possível revelar-me naquilo que não mostro…
Repara meu amor, neste momento, junto ao mar, contamos todas as estrelas com o teu nome…

3 de setembro de 2004

Intuição

Às vezes até aos amantes das palavras elas cansam... e pesam, como se cada sílaba carregasse cada um dos 'pecados' do mundo. Estes dias ando assim, talvez por isso esta pausa. Quando isso acontece só a poesia (ou a tentativa do poema) podem aliviar esse peso. Portanto, ainda fresco e sem revisão aí vai «Intuição»:

A luz que me persegue,
de tão leve e intensa,
atordoa-me.

Um dia não poderei mais retê-la...

Por agora
há um halo
(ou uma toca)
onde tudo se confunde no espelho
que reúne todos os mundos,
côncavo e convexo
são então o reflexo
da dimensão material,
o limite do mundo sensível.
Atrás dessa rede as essências vibram!
Quem possui ou dirige os seus sonhos?
Deslizam cores,
todas as cores que não existem,
tonalidades imperceptíveis,
sombras de matizes ausentes...

É então que,
subitamente,
te sonho em mim...
Como chegáste ou porque te recebi
será sempre uma incógnita,
todos os caminhos são sempre uma linha
infinitamente livre,
embora resultem inexoravelmente
de um rumo
há muito traçado.

Vivo-te em mim,
como um laço insondável e eterno
e existir-te é, talvez,
a etapa que permitirá
o início do voo...

Seremos anjos,
um dia,
na intuição lírica
que sobrevem
a todas as dúvidas.