27 de agosto de 2004

Apologia do Ócio


Ora, toda a gente sabe que a filosofia (pelo menos a ocidental) surgiu graças a uma cambada de gregos sem nada para fazer que resolveu pôr-se a pensar sabe-se lá no quê. Também não interessa saber se essa actividade surtiu algum efeito nos tempos que correm, a verdade é que a reflexão é agradável e precisa de espaço e tempo. E, como as coisas mais interessantes da humanidade são aquelas que não servem absolutamente para nada mas também são as únicas que nos permitem viver em vez de sobreviver, hoje venho aqui reclamar o meu direito ao ócio.
Tenho tido uns dias de trabalho tão calmos que até pensei que trabalhar, afinal, fazia bem - estava com algum tempo, podia pensar, fumar uns cigarrinhos descontraída, olhar para o céu (que tem estado azul, ao contrário de algumas previsões pessimistas), parecia até que a criatividade estava mais fluída... e até ía fazendo algumas daquelas coisitas que consideramos úteis (ver o correio, preparar os apoios para o próximo ano, organizar os cacifos dos alunos, etc.) quando hoje de manhã, subitamente, dei por mim a trabalhar quatro horas seguidas, sem tempo para vir aos blogs nem sequer reparar na cor do céu... Assim não se pode pensar, sem pensamento não há filosofia e, quanto aos outros não sei, mas eu, que sou da área, quero reclamar o meu direito ao pensamento.

26 de agosto de 2004

Portugal Olímpico


Gosto de desporto e acredito ainda (abençoada ingenuidade) que os jogos olímpicos são o expoente máximo dessa actividade. O espírito de união, a fraternidade, a partilha de culturas, a igualdade de raças e religiões e outras coisas assim (e onde estão os atletas amadores que deviam povoar o espírito olímpico?) não deixa de ser incentivador, mesmo que permaneça apenas como ideal... Mas esta é uma questão para ser discutida posteriormente...

Ontem, entre o resumo dos jogos e a contabilização de medalhas perguntava-me porque é que, em quase todas as actividades, Portugal tem um rendimento abaixo da média dos países com características semelhantes... perguntava-me se seria por sermos mediterrânicos? Mas o desempenho de Espanha, França, Itália, Grécia, entre outros, deitava por terra essa hipótese; seria por sermos pequeninos? Mas a também pequena Holanda eliminava de imediato essa hipótese; dever-se-ía à pobreza? Mas as sucessivas medalhas da Etiópia não permitiam sustentar essa ideia... Começo a pensar que, em pleno século XXI, havemos de descobrir que somos uma espécie genética estranha e, se assim for, como haveremos de combater isso?

Não quero, no entanto, deixar de saudar os nossos atletas que se esforçaram por obter os melhores resultados possíveis, sobretudo aqueles que, contra esta 'maldição' ainda conseguem ganhar medalhas...

25 de agosto de 2004

O trabalho em Agosto

Pois é, ao contrário do que aparentemente se crê, os professores também trabalham em Agosto (e nos outros meses todos do ano), sobretudo quando nos deparamos com um ministério que exige às escolas aquilo que não consegue cumprir, nomeadamente a nível do respeito de prazos. Nunca compreendi, ou desejo não compreender, porque é que na maioria dos casos a mediocridade é apanágio do poder. Coitado do meu amigo Aristóteles que, se pudesse ter consciência do quão pouco evoluímos desde então, teria considerado em vão todo o seu trabalho. Mas eu, como sou optimista por natureza acredito ainda que as transformações, embora lentas, hão-de ser positivas.
Mas deixemo-nos de coisas tristes, a verdade é que o trabalho em Agosto é também acompanhado pela serenidade do Verão, sobretudo nos dias de calor ameno e brisas mornas. Apesar de quase todos estarem de férias, não há ressentimentos, é como se o espírito do Estio se prolongasse por todo o lado. É isso talvez que me permite hoje, em pleno horário laboral, ter arranjado um momento mágico para escrever estas linhas. De acordo com o meu amigo Luís também eu digo que devia ser sempre Verão...

24 de agosto de 2004

O tempo, as expectativas e o princípio da realidade


Freud, diz a certa altura (não me perguntem exactamente quando nem onde) que o ser humano ao longo do seu desenvolvimento vai vivendo cada vez mais segundo o princípio da relidade e menos segundo o princípio do prazer, o que não é necessariamente mau, aliás como todas as transformações ao longo da vida. O que isto parece querer dizer é que os momentos que espontaneamente nos dão prazer se vão reduzindo em função dos 'deveres' e das 'responsabilidades' que vamos assumindo. mas isto quer dizer também que ganhamos uma maior consciência desses momentos e da sua necessidade, isto é, o que 'perdemos' em tempo podemos ganhar em intensidade. Quanto a mim, um dos problemas que poderão surgir, são as expectativas em relação a esses instantes mágicos... É bom esperar se a espera não for desespero... é bom esperar serenamente... Agradeço pois o tempo de prazer que este momento me proporciona e aqueles que o partilham comigo e me incentivam a dele usufruir. Tentarei corresponder às expectativas... num percurso suave e sereno...

21 de agosto de 2004

Homenagem ao guardador do silêncio


Desde tempos imemoriais que me acompanha a imagem (muito pouco romântica, diga-se) do 'guardador do silêncio'. Eram tempos em que o mar e a terra se enleavam num torpor só pressentido por uns quantos privilegiados. Eu descobria a Torreira e acompanhava-me uma flauta que ainda guardo e, apesar de ser evidente a minha falta de jeito para a coisa, eu acreditava, não fosse aquele homem imponente de mangueira na mão avisar-me peremptório que era o 'guardador do silêncio'. Não valia a pena dizer-lhe que a música só existe devido às pausas (silenciosas) entre as notas musicais. Posso dizer hoje que foi das minhas primeiras lições de música... aquela em que, por imposição, me deixei ficar a ouvir o silêncio. Julgo que, mesmo agora, ainda por lá estou...